quarta-feira, 21 de maio de 2014

Miguel Josino: a Despedida do Irmão

Miguel Josino: a Despedida do Irmão

Miguel e Basto
Miguel tocando, Lane Cardoso cantando e Sebastião Leite

O amigo Sebastião Leite escreveu essa despedida para o “mano” Miguel Josino, o Basto leu ontem na despedida e emocionou a todos. Basto meu irmão, como dizia o Miguel, “saudade mata”. Segue:
Meu irmão,
A vida é como uma sala de espetáculos; entra-se, vê-se e sai-se.
                            É sempre difícil traduzir, nessa pobre linguagem humana, o que seja a separação material com a morte de um ente querido. Mas você, com a coragem que lhe é peculiar, haverá de dar a todos nós seus familiares e amigos, mais uma lição de vida espiritual, pois aqueles que amamos nunca morrem, apenas partem antes de nós.
                            A morte, não nos libera dos laços afetivos. Pelo contrário, estreita-os, pois quem parte, lá do outro lado, tem uma visão mais nítida do mundo e, por isso, tem capacidade de sentir, numa dimensão mais extensa, o amor que une os que partem e os que ficam. Há uma frase de Arthur Shopenhouse que diz: quem não tem medo da vida, não tem medo da morte e você não a temia, talvez por isso a tenha vivido intensamente. Começo a compreender porque tinha tanta ânsia de viajar, de desnudar o mundo, de distribuir seus conhecimentos e postar nas redes sociais.
                            Ainda nessa vida foi capaz de amar e de dizer que amava a todos que pode. A nós, seus familiares, legou-nos incontáveis lições de vida, desde quando veio morar em Natal sozinho na casa de tia Maria Jose, quando escolheu o direito para poder edificar sua obra, quando passou em primeiro lugar no concurso de juiz e não quis assumir. Não esqueço nunca da frase que me disse naquela ocasião: quem sou eu para julgar alguém? Quero isso prá mim não, Mano. Nasci para advogar e vou advogar até morrer, é ajudando o próximo que me realizo, não os julgando.
                            Mano quem sabe no outro plano que já estás não continue ajudando tantos outros como fez nesse.
                            Se a tristeza é uma forma de egoísmo, lhe peço que nos perdoe, perdoe a todos que estão consternados com sua partida. Perdoe especialmente a mamãe que ainda não acredita – nem pode acreditar – que você se foi; a papai, esse gigante que esta experimentando a maior dor a que um homem pode ser submetido quando a ordem natural das coisas se inverte; a seus filhos Pedro e Marilha, que perderam um pai maravilhoso e desde de domingo nos tem dado grandes lições, as suas enteadas que tinham toda razão para tê-lo como pai; as suas sobrinhas que encontravam tio Gueguel sempre com um sorriso farto, a mão pronta para acariciar, o olhar que ensinava.
                            Régia, Daniel e Rodrigo, não somos mais cinco, mas continuaremos sendo um só, como sempre fomos. Nossa união é e continuará sendo nossa característica primeira.
                            Mano, você trabalhou como se vivesses para sempre, amou como se fosses morrer ontem.
                            Aliás meu irmão querido, morre o que? Essa vestimenta densa e pesada que conduzimos na nossa atual encarnação? O espírito se liberta e, lá no alto, ganha uma liberdade maior e mais bela, pois sei que a morte não surpreende o sábio e certamente não o surpreendeu, pois ele sempre está pronto para partir e você não partiu, porque ficou e ficará dentro de cada um de nós.
                            Meu irmão Miguel, que por hora nos deixa, lega-nos inúmeras lições, foi assim até ontem e será sempre que nos lembrarmos de sua obstinação, seu exemplo de vida, pois para ele a coisa mais bela do mundo era a certeza de que muitos eram felizes por sua causa. Por ele, quantos alcançaram seus sonhos, quantos de nós aqui não deve estar pensando num ato humano praticado por ele para o nosso bem e da própria humanidade. Quantos de nós não nos socorremos de sua mente privilegiada? Quantas soluções jurídicas para resolução dos mais diversos problemas saíram de sua mente brilhante? Suas poesias, seus contos entoaram e encantaram milhares de leitores, tocaram o ouvido de tantas que tiveram o privilégio de amá-lo.
                            O Estado e o próprio direito lhe devem muito. Nós os que aqui ficamos lhe devemos muito.
                            Tenho certeza que você sabia que nos deixaria precocemente e talvez por isso nunca deixou de dizer que gostava, que amava, que as pessoas eram importantes para você como soube cativar e cultivar. Externava seus sentimentos de forma simples e nua.
                            Irmão você amou a vida e a viveu tão intensamente que a consumiu.
                            Viveu os últimos anos com uma ânsia tão grande, por vezes fatigado pelas noites indurmidas, mas sempre convicto de que podia fazer algo de bom no dia seguinte. Lutador obstinado, leitor voraz, escrevia como falava, falava com o coração e deixou uma marca própria que fez escola nas várias gerações que pode ensinar (eu, Daniel, Rodrigo, Kaleb e Fernando José tivemos o privilégio de tê-lo muito perto como professor), homem de inegável espírito público que dedicou sua vida as causas que acreditou, acreditou que a vida era para ser vivida sem medo da partida e foi assim até seu ultimo instante.
                            Meu caro irmão, aprendi com você que o caminho deve ser humilde, sem complicações. Você tinha muita fé em Deus e já estando com ele há de interceder por todos nós que ficamos, há de pedir para que compreendamos porque nos deixou tão subitamente.
                            Vá meu irmão querido, vá. Vá mas vá pleno, vá certo de que cumpriu seu dever e que deixa em cada um de nós uma semente e que mesmo na morte fez várias famílias felizes e que parte de você pulsa noutros sete corações.
                            Descanse em paz.
SEBASTIÃO RODRIGUES LEITE JUNIOR

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